21 de junho de 2009

Mais uma do Veríssimo: "O quê é um peido pra quem ta cagádo!!!"

A expressão do título é conhecida de todos, mas o texto que aoriginou é menos.É uma obra de Luis Fernando Veríssimo sobre a obra veríssima que elefez numa viagem para Miami.
Aeroporto Santos Dumont, 15:30.
Senti um pequeno mal-estar causado por uma cólicaintestinal, mas nada que uma urinada ou uma barrigada não aliviasse. Mas, atrasado para chegar ao ônibus que me levaria para o Galeão, deonde partiria o vôo para Miami, resolvi segurar as pontas. Afinal de contas são só uns 15 minutos de busão. "Chegando lá, tenho tempo de sobra para dar aquela mijadinha esperta,tranqüilo, o avião só sairía às 16:30".
Entrando no ônibus, sem sanitários. Senti a primeiracontração e tomei consciência de que minha gravidez fecal chegara aonono mês e que faria um parto de cócoras assim que entrasse nobanheiro do aeroporto. Virei para o meu amigo que me acompanhava e, sutil falei: "Cara, mal posso esperar para chegar na merda do aeroporto porquepreciso largar um barro". Nesse momento, senti um urubu beliscando minha cueca, mas botei aforça de vontade para trabalhar e segurei a onda.
O ônibus nem tinha começado a andar quando, para meu desespero, umavoz disse pelo alto falante: "Senhoras e senhores, nossa viagem entreos dois aeroportos levará em torno de 1hora, devido a obrasna pista". Aí o urubu ficou maluco querendo sair a qualquer custo. Fiz um esforço hercúleo para segurar o trem merda que estava para chegar naestação anus a qualquer momento. Suava em bicas. Meu amigo percebeu e, como bom amigo que era, aproveitou para tirar um sarro.
O alívio provisório veio em forma de bolhas estomacais, indicando que pelo menos por enquanto as coisas tinham se acomodado. Tentava me distrair vendo TV, mas só conseguia pensar em um banheiro, não com uma privada, mas com um vaso sanitário tão branco e tão limpo que alguém poderia botar seu almoço nele. E o papel higiênicoentão: branco e macio, com textura e perfume e, ops, senti um volume almofadado entre meu traseiro e o assento do ônibus e percebi, consternado, que havia cagado. Um cocô sólido e comprido daqueles que dão orgulho de pai ao seu autor. Daqueles que dá vontade de ligar pros amigos e parentes e convidá-los a apreciar na privada.
Tão perfeita obra, dava pra expor em uma bienal. Mas sem dúvida, a situação tava tensa. Olhei para o meu amigo, procurando um pouco de piedade, e confessei sério: "Cara, caguei!". Quando meu amigo parou de rir, uns cinco minutos depois,aconselhou-me a relaxar, pois agora estava tudo sob controle. "Que se dane, me limpo no aeroporto", pensei."Pior que isso não fico".
Mal o ônibus entrou em movimento, a cólica recomeçouforte. Arregalei os olhos, segurei-me na cadeira mas não pude evitar, e sem muita cerimônia ou anunciação, veio a segunda leva de merda. Desta vez, como uma pasta morna. Foi merda para tudo que é lado,borrando, esquentando e melando a bunda, cueca, barra da camisa, pernas, panturrilha, calças, meias e pés. E mais uma cólica anunciando mais merda, agora líqüida, das que queimam o fiofó do freguês ao sair rumo a liberdade. E depois um peido tipo bufa, que eu nem tentei segurar. Afinal decontas, o que era um peidinho para quem já estava todo cagado...Já o peido seguinte, foi do tipo que pésa. E me caguei pela quartavez. Lembrei de um amigo que certa vez estava com tanta caganeira queresolveu botar modess na cueca, mas colocou as linhas adesivas viradaspara cima e quando foi tirá-lo levou metade dos pêlos do rabo junto. Mas era tarde demais para tal artifício absorvente. Tinha menstruado tanta merda que nem uma bomba de cisterna poderia meajudar a limpar a sujeirada.
Finalmente cheguei ao aeroporto e saindo apressado com passoscurtinhos, supliquei ao meu amigo que apanhasse minha mala nobagageiro do ônibus e a levasse ao sanitário do aeroporto para que eupudesse trocar de roupas. Corri ao banheiro e entrando de boxe em boxe, constatei falta de papelhigiênico em todos os cinco. Olhei para cima e blasfemei: "Agora chega, né?". Entrei no último, sem papel mesmo, e tirei a roupa toda para analisarminha situação (que concluí como sendo o fundo do poço) e esperar pelaminha salvação, com roupas limpinhas e cheirosinhas e com ela umalufada de dignidade no meu dia. Meu amigo entrou no banheiro com pressa, tinha feito o'check-in' e ia correndo tentar segurar o vôo. Jogou por cima do boxe o cartão de embarque e uma maleta de mão esaiu antes de qualquer protesto de minha parte. 'Ele tinha despachadoa mala com roupas'.Na mala de mão só tinha um pulôver de gola 'V'.
A temperatura em Miami era de aproximadamente 35 graus. Desesperado comecei a analisar quais de minhas roupas seriam, dealgum modo, aproveitáveis. Minha cueca, joguei no lixo. A camisa era história.As calças estavam deploráveis e assim comominhas meias mudaram de cor tingidas pela merda. Meus sapatosestavam nota 3, numa escala de 1 a 10. Teria que improvisar. A invenção é mãe da necessidade, então transformei uma simplesprivada em uma magnífica máquina de lavar. Virei a calça do lado avesso, segurei-a pela barra, e mergulhei aparte atingida na água. Comecei a dar descarga até que o grosso damerda se desprendeu. Estava pronto para embarcar.
Saí do banheiro e atravessei o aeroporto em direção aoportão de embarque trajando sapatos sem meias, as calças do ladoavesso e molhadas da cintura ao joelho (não exatamente limpas) e opulôver gola 'V', sem camisa. Mas caminhava com a dignidade de um lorde. Embarquei no avião, onde todos os passageiros estavamesperando o 'RAPAZ QUE ESTAVA NO BANHEIRO' e atravessei todo ocorredor até o meu assento, ao lado do meu amigo que sorria.A aeromoça aproximou-se e perguntou se precisava de algo. Eu cheguei a pensar em pedir 120 toalhinhas perfumadas paradisfarçar o cheiro de fossa transbordante e uma gilete para cortar ospulsos,mas decidi não pedir:"Nada, obrigado". Eu só queria esquecer este dia de merda. Um dia de merda...Luis Fernando Veríssimo (verídico).